Um termo que estava sumido do noticiário havia anos voltou a merecer as manchetes dos jornais brasileiros: estagflação. A palavra é usada para descrever um cenário de estagnação econômica (baixos consumo e produção e alto desemprego) combinada com inflação alta, algo muito raro, mas uma façanha nada surpreendente para uma dupla demolidora como Bolsonaro-Guedes.
A estagflação não é comum porque, normalmente, a inflação aparece quando a economia está crescendo. Nos momentos em que há empregos e a população compra mais, as empresas percebem que podem cobrar mais caro por seus produtos. Mas, se a economia perde a força, as vendas caem, e as empresas não sobem os preços.
Então, como surge a estagflação? Em artigo publicado em abril deste ano, alertando para o risco de o Brasil entrar nessa combinação desastrosa, o economista Rodrigo Zeidan explicava: “Sob certas condições, como crises cambiais, quebra de confiança nas políticas governamentais ou racionamento de energia elétrica, acontece o pior: desaceleração econômica e preços em alta simultaneamente”.
Jair Bolsonaro e Paulo Guedes conseguiram produzir os três exemplos dados. O Brasil vive hoje um grave quadro cambial, com o dólar nas alturas; o atual governo não inspira nenhuma confiança, fazendo uma gestão genocida da pandemia e sendo capaz até mesmo de estimular paralisações nas estradas; e há risco real de um novo apagão, o que não estimula ninguém a aumentar a produção, afinal, pode faltar energia no futuro próximo.
O que se vê é um quadro muito parecido com o de estagflação. A inflação dos últimos 12 meses, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), está em 9,68%, sendo que já passou dos dois dígitos em 16 das 27 capitais. Já a produção industrial desaba, com mais uma queda (de 1,3%) registrada de junho para julho, e nem o tão celebrado agronegócio vive bons dias (a produção de cereais, leguminosas e oleaginosas estimada para 2021 recuou 1% em agosto). Com isso, o desemprego se mantém em níveis recordes, afetando mais de 14 milhões de brasileiros.
Erros em série
O governo pode argumentar que outros países vivem problema semelhante. Mas a política econômica de Bolsonaro-Guedes é certamente responsável pelo que ocorre no Brasil. A inflação tem como dois de seus principais vilões os combustíveis e o preço do alimentos. Com relação aos primeiros, a alta dos preços está diretamente ligada à política de dolarização empreendida na Petrobras, que força o brasileiro a pagar em dólar (e dólar alto) por um combustível fabricado no país.
Já o preço dos alimentos é fruto do abandono da política de formação de estoques, adotada nos governos Lula e Dilma tanto para garantir a segurança alimentar da população quanto para o governo conseguir influenciar no preço. O país, que já chegou a estocar 1 milhão de toneladas de arroz, em 2013, fez esse estoque cair para pouco mais de 20 toneladas em 2020 (veja gráfico abaixo).
O mesmo pode ser dito sobre a crise energética. A falta de água para movimentar as usinas hidrelétricas hoje não é resultado apenas da seca, mas também da má gestão, uma vez que o governo demorou para acionar as termelétricas e deixou o nível de reservatórios importantes chegar ao limite. Resultado: o PIB brasileiro, no último trimestre, recuou 0,1%, enquanto a média mundial foi de 3% de crescimento.
Receita neoliberal fracassada
Os economistas ligados ao mercado e que a imprensa nacional adora ouvir não perdem tempo e recomendam a velha receita neoliberal: aumento das taxas de juros e aceleração das reformas. O que fazem, porém, é só seguir a cartilha ensinada pelo guru dos neoliberais, o economista Milton Friedman, segundo o qual as crises devem ser aproveitadas para impor aos países as medidas que agradam ao capital.
Longe de ser solução, a alta da taxa de juros nem sempre reduz a inflação, especialmente quando os preços sobem porque o dólar está alto, como agora, e o governo faz uma série de péssimas escolhas. E juros altos trazem ainda um reflexo nocivo, que é o de reduzir a produção, deixando a economia ainda mais desaquecida. Já as tão incensadas reformas, há muito vêm mostrando que só servem para tirar direitos dos trabalhadores e não aumentar o emprego.
A estagflação ameaça o Brasil de maneira mais preocupante que a maioria dos países do mundo porque o país conta hoje com um governo que não está interessado em utilizar o Estado para induzir o crescimento. Pelo contrário, só pensa em vender os bens e as riquezas nacionais e enxugar o orçamento ao máximo, submisso ao criminoso teto de gastos.
Em 2008, no governo Lula, o Brasil se tornou o último país a entrar na crise iniciada naquele ano e o primeiro a sair porque o Estado fez seu papel de estimular a economia, ajudando as empresas a manter sua produção e o trabalhador, seu poder de compra. Hoje, Bolsonaro e Guedes fazem o contrário e adotam o discurso de que não há nada a fazer e tiram do Brasil sua capacidade industrial.
Repetem, assim, de forma ainda mais extremada, o modelo adotado por Fernando Henrique Cardoso, que resultou em um crescimento pífio (média do crescimento do PIB de 2,3%, contra 4,1% do governo Lula) e no retorno da inflação de dois dígitos em 2002 (veja quadro abaixo), um cenário que, depois de corrigido por Lula, só voltaria a ocorrer em 2015, com a sabotagem feita ao governo de Dilma Rousseff, atacado por pautas bombas no Congresso e um locaute nas estradas com claras intenções políticas, patrocinado por aqueles que defendiam o impeachment fraudulento e o golpe de 2016.
Matéria originalmente publicada no site do PT Nacional