Por determinação de Bolsonaro, Ministério da Saúde altera registros sobre pandemia em boletins epidemiológicos para esconder a realidade. PT cobra transparência e Brasil vira alvo de críticas na comunidade internacional e na mídia estrangeira
O Ministério da Saúde soltou dois boletins epidemiológicos, na noite de domingo, 7 de junho, com números discrepantes para os casos de Covid-19 no Brasil. Entre uma nota e outra, no intervalo de 1 hora, o governo Bolsonaro “sumiu” com 857 óbitos, numa manobra que levou especialistas a criticarem a pasta por manipulação de dados. Parlamentares do PT, como a presidenta da legenda, deputada Gleisi Hoffmann (PR), e dois ex-ministros da Saúde nos governos Lula e Dilma, condenaram a tentativa de esconder o quadro da pandemia aos olhos do mundo. O país tem quase 37 mil mortos pelo Covid-19 e mais de 691 mil infectados.
O governo tentou explicar que corrigiu duplicações e atualizou os dados divulgados ontem à noite. A pasta divulgou primeiro 1.382 mortes, mas depois alterou o número para 525 – uma redução de 857 óbitos. O ministério, sem comando desde a demissão de Nelson Teich, no início de maio, justificou a mudança porque havia dados divergentes em Roraima e Ceará. A justificativa, contudo, gerou desconfiança. No final de semana, o próprio Jair Bolsonaro anunciou que a elaboração do boletim passaria por mudanças de procedimento.
“Só faltava essa, melhorar resultados escondendo os números. Foi para isso que os militares assumiram o Ministério da Saúde?”, questionou Gleisi. “O desespero de Bolsonaro, por não ter enfrentado a crise como deveria, está evidente”. Ela diz que o governo conseguiu se desmoralizar ainda mais perante o mundo. Depois da reação estúpida do presidente, que ignorou recomendações médicas sobre o tratamento do Covid-19 com o uso de hidroxicloroquina e ter desprezado as sugestões da comunidade científica para manter medidas de isolamento social como forma de evitar, o governo agora manobra estatísticas.
Ex-ministro da Saúde, o senador Humberto Costa (PT-PE) criticou a medida do governo: “Mais uma ação cruel e ilegal de Bolsonaro”, atacou. “O presidente está interferindo criminosamente na saúde”. Outro ex-titular da pasta, o deputado Alexandre Padilha (PT-SP) também acusou o governo de distorcer a pandemia. “Bolsonaro evidencia um projeto de mascarar dados naquilo que está sendo ponto crucial da crise de seu governo: sua incompetência no enfrentamento ao Covid-19”, ressaltou.
Na manhã desta segunda-feira (8), manifestantes protestaram contra o governo em frente ao Palácio do Planalto, despejando tinta vermelha no chão para sinalizar a omissão criminosa do governo na contenção da pandemia. O presidente reagiu aos protestos ocorridos no domingo, contra a sua gestão, em 20 capitais: “Estão começando a colocar as mangas de fora”, disse a apoiadores, na saída do Palácio da Alvorada.
Militares pressionam
O jornal ‘Valor Econômico’ denunciou que militares ocupantes de postos chave no Ministério da Saúde estão pressionando técnicos a maquiar dados relativos aos casos de Covid-19. A pasta está sob o comando do General Eduardo Pazuello. A pressão atinge até mesmo a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que produz relatórios usados para consumo interno do Centro de Coordenação de Operações da Casa Civil – grupo que atua no Palácio do Planalto e reúne funcionários de vários ministérios. A Abin está subordinada ao General Augusto Heleno. E a Casa Civil está sob o comando do General Braga Neto.
De acordo com o jornal, a maquiagem de dados começou a tomar forma ainda na sexta-feira, 5 de junho, quando os dados, divulgados em horário cada vez mais tardio, também sofreram mudanças na apresentação dos números diários de casos e óbitos. O horário da divulgação, às 21h30, após o fim do ‘ Jornal Nacional’, foi uma ordem direta de Bolsonaro, de acordo com o ‘Valor’. A decisão maculou a já desprestigiada imagem do país na comunidade internacional.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) cobrou transparência nesta segunda-feira e fez um apelo para que o governo brasileiro mantenha racionalidade na publicação de casos do novo coronavírus. “O Brasil é um país grande, com uma população muito diversa, com uma população vulnerável, especialmente em zonas urbanas e indígenas”, afirmou Michael Ryan, diretor de operações da OMS. “É muito importante que as mensagens sobre transparência e compartilhamento de informação sejam consistentes e que possamos confiar em nossos parceiros no Brasil para fornecer informação para nós”.
Ryan disse que mais importante é assegurar à população brasileira acesso às informações confiáveis. “Eles precisam entender o que está ocorrendo. Eles precisam entender onde o vírus está. Precisamos administrar o risco para eles”, comentou.
Na imprensa internacional, a manipulação de dados da pandemia pelo governo brasileiro é alvo de reportagens. Jornais influentes mostraram surpresa e perplexidade com o fato de o governo esconder dados do público. Os jornais ingleses ‘Financial Times’ e ‘The Guardian’, o português ‘Público’, o espanhol ‘El País’, e o americano ‘Washington Post’, além do alemão ‘Zeit’ e do indiano ‘The Hindu’, apontam que o Brasil deixou de divulgar dados de mortos do Covid-19 e apagou dados do site oficial do Ministério da Saúde.
A mídia estrangeira relata que o governo é acusado de totalitarismo e censura depois que Bolsonaro ordenou o fim da publicação de números. Despacho da Associated Press sobre a tentativa do governo de esconder os números reais da doença foi replicado em jornais como ‘New York Times’ e é reproduzido em mais de 4,7 mil sites. O texto diz que os dados estão confundindo especialistas.
Da Redação
Matéria originalmente publicada no site: Partido dos Trabalhadores e replicada neste canal.