Fome é o presente de Natal do governo Bolsonaro-Guedes

Nada de brinquedo ou videogame. A carta para o Papai Noel do pequeno Hector, de sete anos, ganhou as redes sociais com um pedido inusitado.

8 dez 2021, 13:05 Tempo de leitura: 10 minutos, 24 segundos
Fome é o presente de Natal do governo Bolsonaro-Guedes

Governos do golpe demoliram o arcabouço de proteção social construído pelas gestões petistas. Regressão faz o país reviver cenas superadas entre 2003 e 2016.

Imagem: site do PT

Nada de brinquedo ou videogame. A carta para o Papai Noel do pequeno Hector, de sete anos, ganhou as redes sociais com um pedido inusitado. “Meu sonho é ganhar uma carne para assar com a minha família”, escreveu o menino de Arroio Grande (RS), que comeu churrasco pela última vez no Natal passado. No outro extremo do país, matéria da Folha de São Paulo flagrou pessoas apelando a restos e lagartos para driblar a fome.

A cena ocorreu no município potiguar de Senador Elói de Souza, em estado de calamidade pública devido à seca. Na reportagem, o agricultor Adailton Oliveira conta que ajudou a abater um boi faminto que agonizava de fraqueza e compartilhou pedaços repartidos onde caíram. Uma das patas dianteiras rendeu 20 dias de refeições preparadas no fogão a lenha improvisado, porque também não há dinheiro para gás.

“Ao invés de deixar a vaca para urubu e cachorro, a gente tem que comer”, justifica Adailton. “É isso porque não tem outro jeito. Sem chuva não se planta o que comer e se acabam os animais. Também não existe mais passarinho para desfrutar, e a gente não tem condição de pedir no mercado ‘bota 1 kg de carne com osso’.” Até calangos e lagartos tijuaçu migraram em busca de água. Sobraram os répteis menores.

Mais da metade (52%) dos municípios do Rio Grande do Norte se encontram em situação de “seca grave”. A Agência Nacional de Águas (Ana) revela que a área com esse diagnóstico aumentou, e o estado é o mais afetado pela estiagem no Nordeste.

Em outubro, o governo de Fátima Bezerra (PT) lançou um plano estadual de convivência com o semiárido, uma vez que o desgoverno Bolsonaro esvaziou programas federais com esse intuito, como o de construção de cisternas.

A Secretaria de Estado do Trabalho, da Habitação e da Assistência Social calcula que 370 mil famílias potiguares estejam na extrema pobreza, o maior patamar em uma década. O número de famílias em situação de pobreza também subiu: mais de 1 milhão de pessoas, quase 38% da população, na pobreza e na extrema pobreza.

“Evidentemente, a seca agrava o quadro”, diz a secretária, Iris Oliveira. “Mas tem vários fatores, como a fila de espera no Bolsa Família. Várias famílias, desde 2019, 2020, aguardam para entrar no programa, e isso dificulta o direito à renda”. A eliminação de postos de trabalho e o encarecimento da cesta básica, que hoje vale 60% do salário mínimo, pioram o cenário.

“Vários municípios e comunidades tradicionais do estado estão com o mesmo problema da fome. O cenário é de privação de um direito humano essencial para a sobrevivência: o Direito Humano à Alimentação Adequada”, diz a professora do Departamento de Nutrição da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Nila Pequeno.

“Essa aquisição de alimentos, da quantidade à qualidade nutricional inadequada, é socialmente inaceitável e rompe padrões de alimentação naturalmente estabelecidos”, afirma a pesquisadora na área de segurança alimentar e integrante do Conselho de Segurança Alimentar do estado. Segundo ela, “pássaros, lagartos e pebas, incomuns para a maior parte da população brasileira, mas há muito retratados nos episódios de seca e fome no sertão nordestino”, são o que resta quando a fome aperta.

Enquanto isso, o desespero se multiplica pelo país. No Rio de Janeiro, as pessoas disputam restos de comida em basculantes de caminhões de lixo, enquanto ossos antes descartados agora são vendidos em açougues de Santa Catarina e Fortaleza.

Até a classe média anda com o bolso retraído. Em outra reportagem da Folha, Heloísa Xavier, diretora da JOX Assessoria Agropecuária, constata que a clientela sumiu dos açougues. “É um mercado inconsistente para este período do ano. Falta poder aquisitivo da população, e o dinheiro que está entrando vai para pagar contas atrasadas e as que estão vencendo”, afirmou. “O mercado tem carne, mas falta o consumidor.”

O Brasil saiu do Mapa da Fome das Nações Unidas em 2014, mas o “conjunto da obra” dos governos do golpe – inflação descontrolada, desemprego acentuado e queda do poder de compra – agravou a insegurança alimentar. Hoje, mais de vinte milhões de pessoas acordam de manhã sem saber se comerão naquele dia. “O cenário piora desde 2016, com o esvaziamento e desmonte de políticas públicas”, diz a professora da UFRN.

Imagem: site do PT.

Lula lançou as bases da ascensão social

O golpe de 2016 interrompeu uma das metas mais bem-sucedidas dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Suas políticas de distribuição de renda promoveram a maior redução da pobreza da história do Brasil. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que ela caiu de um patamar de 42 milhões de pessoas, em 2002, para 14 milhões em 2014.

Além do Bolsa Família, a geração de 19,4 milhões de empregos com carteira assinada, a política de valorização do salário mínimo e a expansão do direito à aposentadoria e aos benefícios assistenciais sustentaram essa trajetória de baixas sistemáticas nos índices da pobreza.

Desde 2003, quando Lula lançou a estratégia Fome Zero para evidenciar a prioridade do combate à fome, o país galgou os degraus da prosperidade para todos. Graças à ampliação do acesso à renda, aliada ao fortalecimento da agricultura familiar com programas como o PRONAF, Garantia Safra, PAA e o PNAE (Alimentação Escolar), com forte impacto na produção de alimentos, a fome caiu 82% entre 2003 e 2014.

Bolsa Família

O Bolsa Família foi criado em 2003 com os objetivos de aliviar a pobreza e a fome, incluir as crianças na educação, reduzir o abandono escolar e ampliar o acesso dos beneficiários à saúde, principalmente de crianças e gestantes. Graças ao programa, 36 milhões de brasileiros e brasileiras foram mantidos fora da extrema pobreza.

Estudos publicados por pesquisadores independentes permitiram ainda apurar benefícios que iam muito além do previsto. O Bolsa Família fortaleceu a economia local. Para cada R$ 1 investido no Programa, R$ 1,78 retornavam para a economia. Com o Bolsa Família, a mortalidade infantil por desnutrição foi reduzida em 58% e, por diarreia, em 46%. As gestantes do programa tinham 50% mais de presença no pré-natal.

Já o Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) é uma plataforma de coleta de dados e informações das famílias de baixa renda. Com o governo Lula e o Bolsa Família, o CadÚnico passou a ter efetividade e se transformou na porta de entrada das famílias para a rede de proteção e oportunidades de inclusão.

Em 2003, 40% dos brasileiros e brasileiras, exatamente os mais pobres, não se encontravam em registros dos programas federais. O CadÚnico foi a ferramenta para tornar essas famílias visíveis ao Estado. Até 2014, mais de 27 milhões de famílias estavam cadastradas em 20 programas como: Luz para Todos, Cisternas, Pronatec, Mais Médicos, Mais Educação, creches etc., além de programas estaduais e municipais.

Dilma avançou no combate à miséria

Em 2011, no início do governo Dilma, com a meta de, em 4 anos, superar a extrema pobreza, é lançado o Plano Brasil sem Miséria (BSM). A sólida base de políticas públicas construídas no governo Lula e no CadÚnico permitiu montar uma estratégia intersetorial envolvendo 22 ministérios e 120 ações, além de estados e municípios.

Dar mais um salto no combate à pobreza era necessário e o foco passava a ser aqueles que, mesmo com a ampliação de direitos e oportunidades do período 2003/2010, não haviam conseguido superar a extrema pobreza. O Plano Brasil Sem Miséria tinha um tripé: busca ativa dos que ainda estavam fora do CadÚnico e ampliação das ações de acesso à renda; encaminhamento a serviços e programas sociais; e inclusão produtiva.

As ações de Inclusão Produtiva Urbana eram integradas ao BSM, pois as razões para que uma família esteja em situação de pobreza são múltiplas, não se restringem a questões econômicas ou à falta de trabalho. Com o Brasil sem Miséria, mais pessoas tiveram oportunidades de emprego e geração de renda.

O Pronatec Brasil sem Miséria foi o principal instrumento para essa inclusão. Foram oferecidos mais de 600 diferentes tipos de cursos de qualificação profissional, com 1,8 milhão de matrículas para beneficiários do Bolsa Família entre 2011 e 2015, dos quais 67% mulheres e 47% com idade entre 18 e 29 anos.

O sucesso na inclusão dos mais pobres se deveu ao apoio da rede de assistência social na mobilização e inscrição do público e identificação dos parceiros locais. Um terço dos beneficiários do Bolsa Família que fizeram um curso no Pronatec conseguiram seu primeiro emprego formal.

Microempreendedores individuais

Mais de 1,6 milhão de inscritos no Cadastro Único foram formalizados como Microempreendedores Individuais, sendo 724 mil do Bolsa Família. Destes, 94% eram mulheres e 67%, negros e negras. Uma parceria com o SEBRAE possibilitou que mais de 200 mil beneficiários do Bolsa Família fossem incluídos nos Programas de Assistência Técnica. Foi constituído também o Pronatec Empreendedor, com foco na Gestão.

O Brasil sem Miséria construiu estratégias e ações específicas voltadas para os mais pobres do meio rural. Ali, em cada 3 moradores, 1 era extremamente pobre, em 2011, e a severidade da pobreza era 5 vezes superior ao urbano. Nesse sentido, o esforço foi enfrentar a pobreza em todas as suas dimensões nas áreas rurais: proteção e desenvolvimento social, geração de renda e inclusão produtiva.

O BSM na área rural foi uma grande força-tarefa para não deixar ninguém para trás. Programas como Bolsa Família, Garantia-Safra, Bolsa Verde e Aposentadoria Rural foram fortalecidos e expandidos a fim de que todos tivessem uma garantia de renda mínima para sair da miséria. Caminho da Escola e Mais Médicos ajudaram ainda no acesso aos serviços básicos de saúde e educação.

Subsidiado pelas informações do Cad Único e outras bases sobre a popu lação rural, o governo federal planejou o direcionamento desses programas de maneira focalizada. Foram levadas ao público mais pobre do campo ações do “pacote” de inclusão produtiva rural, constituído por ações de assistência técnica especializada, recursos para investir nas propriedades, ampliação do acesso à água e à energia elétrica e apoio à comercialização da produção por meio de compras públicas e privadas.

A pobreza e a extrema pobreza reduziram-se fortemente em todas a zonas rurais do país – e de forma ainda mais forte entre os que mais precisavam: 2,1 milhões de famílias rurais de baixa renda foram impactadas pela estratégia de inclusão produtiva rural do BSM. Foram investidos R$ 10 bilhões de reais entre 2011 e 2014 (para além do PBF e benefícios), o que permitiu que essas famílias ampliassem suas fontes de renda, a produção de alimentos e o acesso ao mercado de trabalho.

Programa Luz para Todos

O Programa Luz para Todos foi criado em 2004 e cumpriu o objetivo de universalizar o acesso à energia elétrica para moradores rurais de todo o país. Foram 3,3 milhões de famílias e cerca de 15,9 milhões de brasileiros e brasileiras atendidos. Estima-se que as obras do Luz para Todos tenham gerado cerca de 498 mil novos postos de trabalho.

Os recursos da Função Assistência Social foram multiplicados por 4 em termos reais, se comparados os valores do final do governo Fernando Henrique Cardoso e os de fins de 2015. Esse montante passou de 0,55% para 1,22% do PIB no mesmo intervalo de tempo.

Matéria publicada originalmente no site do PT e replicada neste canal.