Mais uma vez, o Boletim Focus projeta alta da inflação e queda da economia. “Prévia do PIB” do BC já aponta para recessão técnica, enquanto “posto ipiranga” fala em crescimento
No primeiro dia útil após Paulo Guedes pintar um Brasil idílico para potenciais investidores árabes, seus próprios pares do mercado financeiro se encarregaram de desmentir as falácias do ministro-banqueiro. O Boletim Focus divulgado nesta terça-feira (16) revisa para cima a inflação pela 32ª semana seguida, enquanto rebaixa o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) pela quinta semana consecutiva.
Autor do Boletim, o Banco Central (BC) arrematou as projeções pessimistas dos analistas do mercado financeiro com uma constatação oficial: a economia brasileira caminha para a recessão. É o que aponta a “prévia do PIB”, também anunciada nesta terça: o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) registrou queda de 0,27% em setembro, indicando que a retração no terceiro trimestre deve chegar a 0,14%.
O recuo da prévia do PIB no terceiro trimestre ocorre após retração nos três meses anteriores, entre abril e junho. Segundo o BC, o IBC-Br registrou queda de 0,35% no período. O indicador aponta a possibilidade de uma recessão técnica, que se caracteriza por dois trimestres seguidos de contração do PIB. O resultado será ou não confirmado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2 de dezembro.
Para o PIB do país, a previsão do relatório de mercado Focus agora é de alta de 4,88% em 2021, contra 4,93%, na semana passada, e 5,01%, no mês passado. Para 2022, a expectativa já está abaixo de 1% (0,93%). No começo do ano, a previsão era de alta de 2,5% em 2022. A expectativa começou a ser revisada para baixo em setembro. Para 2023 e 2024, o mercado financeiro projeta expansão de 2%.
Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial da inflação, deve fechar o ano com acumulado de 9,77%, já na fronteira dos dois dígitos. A projeção é 0,44 ponto percentual acima da divulgada na semana passada. Há um mês, previa-se inflação de 8,69%. O IPCA para 2022 também foi revisado, de 4,63% para 4,79%. Para 2023 e 2024, as previsões são de 3,32% e 3,09%.
Em outubro, puxada pelo aumento de preços de combustíveis e alimentos, a inflação acelerou 1,25%, a maior para o mês desde 2002. Com isso, o indicador acumula altas de 8,24% no ano e de 10,67% nos últimos 12 meses. E inflação alta gera juros altos.
Para o mercado financeiro, a expectativa é de que a Selic encerre 2021 em 9,25% ao ano, mesma projeção da semana passada. Para o fim de 2022, a estimativa é de que a taxa básica suba para 11% ao ano. E para 2023 e 2024, a previsão é de Selic em 7,75% ao ano e 7% ao ano, respectivamente. A próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC está prevista para 7 e 8 de dezembro.
Financial Times: “Mal-estar atinge o bolso dos brasileiros”
Em meio a um cenário muito mais propenso ao aprofundamento da crise do que para a luz no fim do túnel, Guedes afirmou, nesta segunda-feira (15), em evento com investidores e empresários em Dubai (Emirados Árabes), que o Brasil está “crescendo acima da média mundial”.
“O Brasil foi uma das economias que menos caíram, voltaram mais rápido, criaram mais empregos e estamos crescendo, também, acima da média mundial. Isso, graças à orientação do nosso presidente de não deixar nenhum brasileiro para trás durante a pandemia”, declarou Guedes, emulando a mitológica Sherazade, a filha do gran vizir que narrou as histórias fantásticas de As Mil e Uma Noites.
“Não apostem contra a economia brasileira que vai dar errado”, prometeu Guedes, na abertura da feira Dubai Air Show. “O Brasil já tem contratados R$ 544 bilhões de investimentos. E com o 5G, são mais R$ 150 bilhões. Acho muito difícil o Brasil não crescer ano que vem”, prosseguiu, multiplicando por três os R$ 46,8 bilhões a serem arrecadados com o leilão do 5G, conforme previsão da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
Guedes ainda atacou a The Economist, que estaria “errando todas” sobre o desgoverno brasileiro. Em reportagem publicada na última semana, a revista britânica disse que Bolsonaro é “nocivo à economia do Brasil”.
Agora, Guedes também terá que rebater o Financial Times. O jornal inglês, porta-voz do mercado financeiro global, destacou nesta segunda: “Custos crescentes se propagam por toda a economia enquanto o governo de Bolsonaro luta contra as consequências políticas”.
“Há um mal-estar que está atingindo o bolso de muitas pessoas no país mais populoso da América Latina, depois que os custos crescentes de tudo, de petróleo a carne, empurraram a taxa de inflação para dois dígitos pela primeira vez em mais de cinco anos”, escreve o correspondente Michael Pooler. “Desde o início de 2020, o real perdeu um quarto de seu valor em relação ao dólar, e caiu 5% até agora neste ano”. Só Guedes, e seu chefe negacionista, não viram.
Da Redação
Matéria publicada originalmente no site Partido dos Trabalhadores e replicada neste canal.