Consulta pública do Exército sobre ‘flexibilização da bala’ revela que Planalto não desistiu dos planos de armar as próprias milícias. Instituto Sou da Paz critica iniciativa do governo, que decidiu dar prazo de 5 dias úteis para colher manifestação da sociedade sem fazer alarde. Enquanto isso, a polícia no Rio e São Paulo vai matando mais e mais
A imprensa saúda a nova faceta do presidente da República. Mas o “Jairzinho Paz e Amor” só existe nas páginas da velha mídia. O verdadeiro nome do presidente remete mais ao personagem Dadinho, do filme “Cidade de Deus”. Está mais para Jair Pequeno do que para Messias. Seu desejo de promover uma guerra civil, como já havia escancarado na famigerada reunião ministerial de 22 de abril, continua. A desconfiança de que a estratégia é assegurar armas nas mãos da milícia para intimidar e calar a oposição não é delírio, mas um olhar atento para a nova armação do Planalto.
O governo montou uma consulta pública camuflada, aberta pelo Exército de maneira fugaz, para fazer de conta que quer saber a opinião da população sobre a flexibilização do controle de armas. A medida foi aberta em 29 de junho, na última segunda-feira, quando abriu-se a consulta do Exército para recolher sugestões da sociedade civil sobre como deve ser regulado o rastreamento de armas e munição pelo governo. A consulta estará aberta somente até 5 de julho, próxima segunda-feira. A denúncia saiu nesta quinta-feira na edição brasileira do ‘ El País’. A consulta está no site do Exército Brasileiro.
O governo finge que quer saber a opinião da sociedade sobre o afrouxamento das regras de rastreabilidade de armas e munição e concede um prazo que pode ser chamado de “ridículo” para a realização da consulta: 5 dias úteis. Enquanto isso, a matança no Brasil prossegue. O Rio de Janeiro teve em abril o mês de maior letalidade policial dos últimos 18 anos. Em São Paulo, as mortes em conflitos com a presença de policiais cresceu mais de 50%.
A pandemia facilitou o cumprimento do ideário bolsonarista “na dúvida, atire”. Como aponta a jornalista Maria Cristina Fernandes, hoje, no ‘Valor Econômico’, a pandemia serviu para a polícia ampliar sua política de abordagem violenta nas ruas: “Com menos circulação de pessoas nas ruas, os policiais ganharam, finalmente, o ansiado excludente de ilicitude do bolsonarismo”.
Na reunião de 22 de abril, Bolsonaro atuou de maneira ostensiva, cobrando do ministro da Defesa, General Fernando Azevedo, e do então ministro da Justiça, Sérgio Moro, que baixassem uma portaria que permitisse aos cidadãos comprarem mais armas e munição. “Quero dar um puta recado para esses bostas”, disse o presidente, naquela ocasião. “Eu quero todo mundo armado”.
No dia seguinte, o Exército atendeu ao pedido de Bolsonaro para revogar as portarias 40, 60 e 61 da regra de controle de armas, que dificultavam o acesso do crime organizado à munição e ao armamento extraviado das forças de segurança. Cobrado pela Justiça, o General Laerte de Souza Santos, chefe do Comando Logístico do Exército, justificou que as portarias estavam “inviabilizando economicamente” a indústria de armas, e as retirou por cobrança de clubes de atiradores e colecionadores – para quem os filhos de Bolsonaro atuam como “garotos propaganda”.
“Essa perda de controle claramente beneficia a qualquer tipo de crime organizado, de tráfico ou milícias, que com menos rastreamento e menos marcação, tem mais chances de se abastecerem com armas e munição e menos chances de verem seus crimes esclarecidos”, criticou Bruno Langeani, gerente de projetos da ONG Instituto Sou da Paz, em entrevista ao ‘El País’. Segundo revelou o ‘Estadão’, em maio, o Superior Tribunal Militar (STM) investiga 15 inquéritos sobre desvio de armas e munição das Forças Armadas para facções criminosas e milícias.
De janeiro a maio deste ano, o volume de armas vendidas no país cresceu 98% em comparação com o mesmo período no ano passado, e 90% em relação a 2018. Ou seja, a claramente um esforço de liberar as armas. Em apenas cinco meses, foram adquiridas 6.343.931 unidades de armas e balas. O Brasil caminha para transformar-se de maneira aberta em um Estado miliciano.
Em maio, em pleno agravamento da pandemia do coronavírus por todo o país, foram vendidos 1.541.780 cartuchos no varejo, 130% a mais que no mesmo mês do ano passado. Isso equivale a mais de 2 mil cartuchos por hora nas mãos de civis. No mesmo período, 11 forças de segurança pública, patrimonial e de inteligência, compraram, em maio, 1,396 milhão de projéteis e balas. Em dezembro de 2018, último mês do governo Michel Temer na Presidência, o comércio registrara a venda de 669.174 munições.
Da Redação
Matéria publicada originalmente no site Partido dos Trabalhadores e replicada neste canal.